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CRINGE PODE ACABAR SE TRANSFORMANDO EM BULLYING

Foto: Ag.Brasil

Por Dr.Wilson Campos



Sou forçado a reconhecer que, de tempos em tempos, querendo ou não surgem gírias que ganham repercussão e causam certo desconforto ou até mesmo conflito entre gerações. Fato é que, recentemente, uma expressão viralizou na internet e todos se perguntam por aí: o que é “cringe”? O termo de origem inglesa é uma gíria que pode ser divertida, engraçada, ou que pode configurar algo constrangedor ou que cause vergonha alheia. Ou seja, refere-se a uma situação que pode representar um mico, piada, ironia, e que, lamentavelmente, se constatada de forma abusiva, pode desaguar num tremendo ato deliberado de bullying. Isso, se a brincadeira passar dos limites toleráveis. As pessoas mais conectadas nas redes sociais têm mais visão do que se trata a mais moderna gíria, que evidencia um conflito curioso entre a geração Y - os chamados millenials (nascidos entre a década de 80 e meados de 90); e a geração Z - nascidos depois de 95. Confesso que a minha idade me coloca fora do alcance dessas brincadeiras, mas preocupa-me o fato de as críticas bastarem para provocar uma guerra geracional; por um lado, com alguns indivíduos defendendo seus amigos e colegas; e por outro, tecendo críticas ácidas aos gostos e jeitos alheios. A internet tem enumerado vários hábitos millenials que causam vergonha alheia aos novinhos: tomar café da manhã, tomar café no geral, falar litrão ou boleto, usar calça skinny, não superar o amor por Harry Potter ou filmes da Disney; partir o cabelo de lado, usar sapatilha de bico redondo, entre outros, uma vez que a lista é extensa. Os millenials não passaram recibo e contra-atacaram, e na lista de mico dos novinhos, eles destacaram: dancinhas do TikTok, usar fancam (vídeos com melhores momentos dos ídolos) para fazer postagens nas redes sociais, usar emojis como ironia e cabelo partido no meio. O certo é que, sem exageros, tudo vai bem, mas quando há o propósito de bullying ou volume alto de vergonha alheia, as coisas saem do controle. O recomendável é manter um bom nível da piada e da ironia, sentindo-se à vontade para criticar comportamentos, roupas, séries, filmes, livros e costumes, mas sem afrontar, desmerecer ou constranger os demais grupos de gerações, sejam mais novos ou mais velhos. Os saudosistas não são perdoados e até mesmo os mais frequentes das redes sociais são criticados por suas manifestações por emoji ou por gostar de filmes água com açúcar ou com mais tempo de vida útil. Os novinhos zoam os mais adultos e vice-versa. Ora, enquanto as coisas ficarem no campo das ideias inofensivas e das brincadeiras aleatórias, tudo é permitido e tudo vai bem, mas deixando de ser assim, quando ocorrerem abusos e imprecações desproporcionais, a gíria ou o “cringe” perde a graça. Na minha área de atuação, a advocacia, tenho observado nos últimos dias o uso de “cringe” por parte de alguns profissionais, que consideram mico o uso do juridiquês, do latim, de certa cor de terno, de usar terno e gravata, de logotipo grande e colorido, de ser chamado de doutor, de discutir em voz alta em audiência, de abreviar certas expressões, de imprimir protocolo para arquivar, e de escrever: Pasme, Excelência! No entanto, como visto no caso da advocacia, nos exemplos acima citados, nem sempre a brincadeira tem sentido, posto que muitos advogados e advogadas têm o direito de escrever, vestir, proceder, falar, discutir, argumentar e peticionar da forma que melhor atenda o momento e caiba no caso concreto, ainda que cometendo alguns pequenos micos no livre exercício da profissão. Ademais, o trabalho na advocacia requer um procedimento adequado e o ritual do ordenamento jurídico não pode ser modernizado ao talante de cada um, sob pena de insucesso na demanda. Portanto, nem tudo pode ser “cringe”. A brincadeira, a gíria e o “cringe” hão de respeitar limites, notadamente quando se tratar de trabalho.

Querem saber se eu sou “cringe”? Não sei ao certo, mas acho que não, uma vez que estou sempre me atualizando, me conectando, estudando, lendo, interagindo, aprendendo e procurando entender o mundo físico e virtual. Mas o “cringe” está aí, causando certo furor entre as gerações. É a vida! Em suma, desde que não prejudiquem, não causem danos nem provoquem bullying ou vergonha alheia às pessoas na intimidade, no ofício, no labor e no trabalho, tudo bem que, respeitosamente, o “cringe” e as brincadeiras proporcionem o devido entretenimento entre as gerações A, B, C ... X, Y e Z.

Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas tributária, cível, trabalhista, empresarial e ambiental/Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB-MG/Delegado de Prerrogativas da OAB-MG).

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