MINISTRO DO TSE FALA DE DEMOCRACIA, MAS NÃO AGE COMO DEMOCRATA
Por Dr. Wilson Campos
A Justiça Eleitoral deveria buscar na Constituição da República o cumprimento do art. 1º, inciso I, e ter como fundamento a soberania popular. A rigor, o senhor presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Edson Fachin, permissa venia, deveria entender que emitir opinião sobre o sistema eletrônico de votação é um direito do eleitor. Ora, a livre manifestação do pensamento é um direito constitucional (art. 5º, inciso IV, da CF).
Ademais, senhor ministro, a votação é anulável quando for negado ou sofrer restrição o direito de fiscalizar, nos termos do art. 221 do Código Eleitoral (Lei 4.737/1965). Também a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos, segundo o art. 237 desta mesma lei.
Não fica bem para o TSE alegar que estão ocorrendo “atentados contra a escorreita atuação da Justiça Eleitoral”, quando a cidadania brasileira reclama maior transparência na apuração dos votos. Negar essa transparência é o mesmo que gerar desconfiança quanto à lisura e à segurança das eleições, independentemente do possível “aperfeiçoamento” do processo eleitoral, que precisa ser provado e não apenas alegado.
Faz-se necessário que o eleitor saiba, de fato, como se dá a apuração em uma urna eletrônica. Não bastam missões de observação eleitoral, posto que a integridade do processo eleitoral restará suspeita se o eleitor não enxergar que seu voto foi destinado realmente ao candidato de sua preferência. Ora, senhor ministro, a confiança é uma via de mão dupla. Se não há indício de fraude comprovado, cabe ao TSE convencer o eleitor e não se dar por ofendido, falar em democracia e agir com autocracia.
A polêmica e a desconfiança cresceram com as notícias de que somente Brasil, Bangladesh e Butão usam urna eletrônica sem comprovante do voto impresso. A maioria dos países imprime comprovantes. Alguns países já abandonaram a ideia da urna eletrônica e voltaram para cédulas em papel.
Também segundo noticiado pela imprensa, muitos países utilizam a segunda geração dessas máquinas, que imprimem um comprovante em papel (o chamado voto impresso), enquanto o Brasil ainda utiliza as de primeira geração e não se aprimora.
A Índia mudou seu sistema, que era igual ao brasileiro, mas depois evoluiu e concluiu a transição, passando a expedir cédulas conferíveis pelos eleitores, que são depositadas, automaticamente, sem contato manual, em urnas indevassáveis, para fins de auditoria, se o caso. Esse é o exemplo a ser seguido, e não o que o TSE quer que o eleitor aceite sem questionar. Ora, alto lá!
Quando o ministro diz que “atentar contra a Justiça Eleitoral é atentar contra a própria democracia”, causa estranheza, porquanto o eleitor, o cidadão, tão somente quer segurança, pede transparência, deseja certeza de que seu voto será destinado ao seu candidato. O eleitor, o cidadão, quer confiar na urna eletrônica, mas exige que a máquina seja confiável, imprima seu voto e garanta uma apuração de forma inquestionável. O eleitor requer que o registro do seu voto seja impresso, para maior segurança. Isso é atentar contra a Justiça Eleitoral?
O TSE não pode e não deve se julgar acima do ordenamento constitucional e muito menos negar os direitos do eleitor. Os questionamentos virão por parte da cidadania e cabe à Justiça julgar com imparcialidade e equilíbrio, uma vez que a liberdade de manifestação do pensamento e a fiscalização da apuração dos votos são direitos efetivos dos eleitores, assegurados pela Constituição Federal e pelo Código Eleitoral, respectivamente.
Não entender essas regras e negar ampla e absoluta transparência no processo eleitoral leva a antecipar aqui os conceitos do que sejam: democracia, autocracia e ativismo judicial.
Vejamos:
Democracia é um regime político em que todos os cidadãos elegíveis participam igualmente - diretamente ou através de representantes eleitos - na proposta, no desenvolvimento e na criação de leis, exercendo o poder da soberania popular por meio do sufrágio universal.
Autocracia tem sentido radical, de poder por si próprio, configurando uma forma de governo na qual há um único detentor do poder político-estatal, ou seja, a autoridade fica concentrada em um único poder, ente ou pessoa.
Ativismo judicial se resume na atuação expansiva e proativa do Poder Judiciário ao interferir em decisões de outros poderes; ao se colocar acima das normas e das regras e mudá-las ao seu talante; e ao adotar conduta que desborda da atuação puramente técnica e judicial.
Com renovada venia, para bem situar o senhor ministro, presidente do TSE, cumpre reiterar na defesa do eleitor e da cidadania brasileira, que a votação é anulável quando for negado ou sofrer restrição o direito de fiscalizar, nos termos do art. 221 do Código Eleitoral (Lei 4.737/1965); e que a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos, segundo o art. 237 deste mesmo Código Eleitoral.
De sorte que fica assim, manifestamente patente e registrado, o verdadeiro sentimento dos brasileiros quanto ao que disse o atual presidente do TSE, e que sirva para o próximo presidente ou para os próximos dirigentes da instância jurídica máxima da Justiça Eleitoral.
Wilson Campos (Advogado/Especialista com atuação nas áreas de Direito Tributário, Trabalhista, Cível e Ambiental/ Presidente da Comissão de Defesa da Cidadania e dos Interesses Coletivos da Sociedade, da OAB/MG, de 2013 a 2021/Delegado de Prerrogativas da OAB/MG, de 2019 a 2021).
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