Polêmica preservação da Mata do Planalto em risco por interesse imobiliário
26/05/2021
CMBH
A Mata do Planalto é uma área de mais de 200 mil m², que abriga o bioma da Mata Atlântica, sendo uma das únicas áreas verdes remanescentes da Região Norte da capital. No terreno, que durante campanha eleitoral Alexandre Kalil (PSD) chamou de intocável, estão mais de 20 nascentes, dezenas de espécies de árvores e de animais, como o mico-estrela e o tucano. Diante do interesse da Direcional Engenharia em usar parte dessa área para a construção de um empreendimento residencial de grande porte, com centenas de apartamentos, garagem para veículos e área de lazer, desmatando cerca de 30% do terreno, a Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana realizou, nesta terça-feira (25/5), por solicitação da vereadora Bella Goçalves (Psol), audiência pública para debater alternativas que permitam a preservação integral da Mata do Planalto, que a parlamentar qualifica como tendo um “valor inestimável” para a capital. Entre os possíveis instrumentos para a preservação integral da área estariam a compra do terreno particular pela Prefeitura; o uso da transferência do direito de construir; e a aprovação de proposições sobre o tema que tramitam na Câmara Municipal de Belo Horizonte.
Para Bella Gonçalves, a Mata do Planalto precisa ser integralmente preservada para esta e as futuras gerações. A parlamentar aponta que, conforme o Superior Tribunal de Justiça (STJ), "não há direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente”. Ela também defendeu a aprovação do Projeto de Lei 1050/2020, de sua autoria em parceria com a ex-vereadora Cida Falabella, que reconhece o valor ecológico, paisagístico, cultural e comunitário da área. Ao projeto foi apresentada por Macaé Evaristo (PT) emenda aditiva, que pretende considerar a Mata do Planalto como área verde protegida do Município de Belo Horizonte. Macaé apresentou a emenda quando foi relatora do projeto na Comissão de Educação, Ciência, Tecnologia, Cultura, Desporto, Lazer e Turismo e, durante a audiência, defendeu a proteção integral da área verde.
Durante a audiência, ativistas pela proteção da Mata do Planalto defenderam o projeto de Bella Gonçalves, a emenda aditiva de Macaé Evaristo, bem como o PL 1630/2015, que declara como sendo de utilidade pública e de interesse social e ambiental para fins de desapropriação a área denominada Mata do Maciel, no Bairro Planalto, a qual deve ser - conforme pleiteia a proposição - anexada ao Parque Municipal Mata do Planalto. O projeto, que é de autoria de 21 vereadores e ex-vereadores, tem a finalidade de preservar a Mata do Planalto, e afirma que a área tem papel essencial para purificar o ar, melhorar o microclima, amortecer ruídos e drenar águas pluviais.
Sociedade civil e especialistas
Magali Ferraz Trindade, da Associação Comunitária do Planalto e Adjacências (ACPAD), defendeu a preservação integral da Mata do Planalto e afirmou que a intenção já apresentada pela empresa Direcional de construir edifícios residenciais com mais de 3.500 vagas de garagem, piscina e playground no local irá prejudicar a Mata Atlântica que lá se encontra. Ela também afirmou que existe abaixo-assinado com milhares de assinaturas pela preservação da Mata do Planalto e solicitou à Câmara que realize visita técnica ao local para que os vereadores possam conhecer a área e verificar in loco a importância de preservá-la.
A coordenadora do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta) da UFMG, Andréa Zhouri, defendeu que a preservação da Mata do Planalto é de enorme importância para o clima. Ela explicou que Belo Horizonte, que participa de iniciativas nacionais e internacionais de contraposição à mudança climática e seus efeitos e já ganhou da organização não governamental internacional WWF o título de capital sustentável, não pode devastar esta área de Mata Atlântica. A professora da UFMG cobrou ações concretas dos governantes pela preservação.
Para Frei Gilvander, que é da Comissão Pastoral da Terra e mora nas proximidades da Mata do Planalto, seria um “pecado capital” a devastação de qualquer parte da mata. Ele lembrou que Alexandre Kalil se elegeu prometendo preservar a área, qualificando-a como intocável. Ainda de acordo com o frei, não basta preservar 70% da área como quer a construtora Direcional, sendo necessária a proteção integral daquele espaço. Ele cobrou que os direitos da natureza e dos animais que lá vivem devem ser levados a sério e defendeu que não é porque o terreno foi comprado por uma construtora que ela passou a ter direito de propriedade absoluto sobre a área. Para Frei Gilvander, o melhor caminho é a desapropriação da área para garantir que a Mata do Planalto seja integralmente preservada.
O engenheiro e membro da ONG Ecoavis – Ecologia e Observação de Aves, Paulo Gonçalves, defendeu que o interesse econômico imediato não pode se sobrepor aos interesses de longo prazo, sendo estes últimos pela preservação da Mata do Planalto. Ele afirmou que a área abriga mais de 58 espécies de aves e cobrou do poder público a proteção da fauna e da flora lá existentes.
Instrumentos para preservação ambiental
Claudia Pires, arquiteta e urbanista que participa do Observatório Metropolitano de Desenvolvimento Sustentável, afirmou que as iniciativas de preservação da Mata do Planalto vêm da sociedade civil organizada. Ainda de acordo com ela, Belo Horizonte tem instrumentos para garantir a preservação integral da área e cabe à Câmara Municipal cobrar do Executivo o uso destes instrumentos. Ela citou o direito de preferência da compra da área pela Prefeitura e, ainda, a transferência do direito de construir, prevista na Lei 11216/2020, que dispõe sobre a aplicação dos instrumentos de política urbana previstos no Plano Diretor do Município. Por meio desta última, o Executivo pode, na falta de dinheiro para comprar a Mata do Planalto, garantir à construtora que detém a propriedade da área o direito de construir em outro terreno, assegurando a preservação da Mata do Planalto, qualificada pela arquiteta como um dos últimos oásis naturais da Região Norte da capital.
De acordo com a Prefeitura, atualmente, não mais tramita qualquer projeto na PBH para construção de imóvel na Mata do Planalto. Segundo representante da Secretaria de Política Urbana, o projeto que tramitava neste sentido caducou e nenhum outro foi apresentado. O Executivo afirmou que a Mata do Planalto hoje é considerada Área de Preservação Ambiental 1 (PA-1), o que lhe garante a proteção máxima da legislação municipal.
Ainda conforme a PBH, a mudança de zoneamento da área que veio com o novo Plano Diretor, além de diminuir a porcentagem que pode ser construída, que passou a ser de 30%, com preservação dos 70% restantes, também reduz o número de unidades possíveis de serem edificadas no local, diminuindo os impactos na área.
Ao afirmar que a Prefeitura não conta hoje com recursos suficientes para a desapropriação e compra de todos os terrenos de particulares onde há área verde a ser preservada, uma das possibilidades aventadas pela PBH para a preservação integral da Mata do Planalto seria o uso da transferência do direito de construir, que está previsto na legislação. A Prefeitura pontua, contudo, que essa transferência do direito de construir não pode ser imposta ao particular, ou seja, o proprietário não necessariamente é obrigado a aceitá-la, devendo haver uma pactuação entre o poder público e o proprietário para o uso deste instrumento. Caso ele seja aceito pelo proprietário da área, a questão da preservação ambiental integral da Mata do Planalto estaria resolvida, pois a área se tornaria uma reserva particular ecológica de caráter perpétuo e aberta ao público.
Vereadores cobram preservação
Duda Salabert (PDT) afirmou que Belo Horizonte vive atualmente a maior crise de saúde publica da história e que quanto mais áreas verdes na cidade maior a promoção da saúde. Ela lembrou que foi eleita defendendo um programa de proteção das áreas verdes da cidade e disse ser contrária ao uso de 30% da área que abriga a Mata do Planalto para a construção de empreendimentos imobiliários. De acordo com a parlamentar, a proteção da Mata do Planalto deve ser integral.
Wilsinho da Tabu (PP) também fez a defesa da preservação da Mata do Planalto, classificou a possibilidade de devastá-la como um crime ambiental e considerou ser importante ouvir o que os ambientalistas e especialistas têm a dizer sobre o tema. Professora Marli (PP) foi outra parlamentar a se colocar a favor da preservação integral da Mata do Planalto, dizendo-se sensível à causa e defendendo a proteção das áreas verdes como condição importante para as futuras gerações.
O presidente da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana, Professor Juliano Lopes (PTC), cobrou que o prefeito cumpra sua promessa de campanha pela preservação da Mata do Planalto e defendeu que a Prefeitura compre a área para que ela possa ser preservada.Também Braulio Lara (Novo) defendeu a preservação da Mata do Planalto por meio da compra da área da construtora pela Prefeitura, de modo a garantir tanto a preservação ambiental quanto os direitos do proprietário do terreno.
Superintendência de Comunicação Institucional
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